A viagem só de ida para Júpiter


Novo compacto do Júpiter Maçã

por Túlio Flávio*

Jamile reforçava de duas semanas pra cá que eu ia tomar conta dessa galera. Tu acha? Tomar conta fazendo o quê? Me perguntava, portanto, que diabos iria fazer: “Ei, não! Não ofereça pó pra ele não, porque ele tá nas últimas! nan nan nin nan nan, você não pode beber Flavinho!!!!” O que acontece na verdade é que os caras são muito diferentes do que imaginávamos. Ray-z tava me dizendo que em Aracajú o episódio ‘eles são os deuses das drogas’ já começou quando a produção de lá foi buscá-los na rodoviária. Foram dois caras embriagados de carro pegar a galera e foram em direção a uma casa – supostamente a casa em que eles iriam descansar em paz. Chegando lá tinha umas 20 pessoas: fãs, freaks, curiosos e um leque de drogas extremamente cavalar. E tudo o que eles queriam era um planeta vizinho, hostil e desabitado para um bom cochilo. Tocaram em Aracajú e se mandaram pra Salvador. A banda é muito tranqüila, já o Flávio é estranho pra porra, achei ele um pouquinho gay também. Os caras da banda dizem que em Porto Alegre todos têm esse jeitinho de ovelhinha afetada. É a velha richa da capital versus interior. O baixista e o baterista são do interior e têm uma banda alá cachorro grande que se chama ‘identidade’. Não gostei. Achei o vocal do cara fraco, embora seja gritado e nervoso. Nada demais.

Levamos a banda para almoçar numa churrascaria (sacanagem, né? mas acho que bateu saudade de uma boa maminha na estrada). Se eles fossem pra um restaurante de comida baiana mais nunca eles teriam cu, por isso a escolha. Blá, blá, blá, visita ao local do show, depois hotel. Quando uma banda daqui de Salvador começou a tocar fomos pegar a galera. Chegando lá desce Flávio e me pergunta se a gente tinha se conhecido em Aracajú. Disse a ele que nunca tinha visto ele mais gordo se não naquele mesmo dia e que compreendia o porquê da pergunta tratando-se de que depois de uma boa dormida o dia de hoje é sempre o dia seguinte. Fiz de conta que seqüela é uma coisa normal, mas o cara é esquisito mesmo.

Já Ray-z(guitarra) tocou no RPM, os ostras, e uma porrada de banda por aí… é o único paulista da banda. Tirei pouca onda dele por causa de Paulo Ricardo. E foi por causa do ego deste último que Ray resolveu se picar pra Porto Alegre. O porquê dessa intriga você descobre na revista contigo de maio de 2003.

O lugar do show aqui em Salvador tinha umas 150 pessoas, não era o esperado. Mas considerando que nesse dia teve Tom Zé por 5 contos, parada gay, e um monte de outros eventos, já considerei uma platéia bem representativa. Aliás, foi isso que Flavio me perguntou: “o público é interessante?”. Respondi que nunca tinha visto um público tão problemático, esquizofrênico e perturbado no mesmo evento em um ano que moro aqui. Ele sorriu com o canto da boca. Só. Quem mais sorria na banda e tinha uma carteirinha de jupiteriana era Talitha, a backing vocal. Ela só sorria. Não dizia uma palavra. Mas nem precisava porque ela era bastante expressiva e conseguia telepaticamente conquistar o seu território.

No show tinha uma menina com um vinil da “nega bombom” cantando as músicas da Júpiter Maçã e uma corja de bêbados levando seus drinks à boca do Flávio (ele não bebia, hu-hu!). Afe Maria, a galera não perdoa. O show deles foi foda, catártico, instigado. As músicas novas do disco que vai sair pelo selo espanhol ‘elefant’ também fizeram a cabeça da galera, numa mistura dessa cena hype com “sou doidão, mas topo tocar na rádio”. Dançante, rock e com uma característica ‘parei de beber’ em evidência.

Já eu não parei de dançar um segundo… e nem parei com o uísque. Acabou o show e levamos os meninos pra o mercado do peixe, um lugar fim de noite onde costumamos apreciar iguarias baianas como manissoba, pititinga, feijoada baiana e um tradicional arrumadinho, e não ‘enroladinho’ como Lucas (baixo) imaginava. Os caras sem dúvida têm um lugar garantido na música brasileira tanto pelos discos, pelo show visceral, quanto pela genialidade do vocalista Flávio Basso. Acho que agora elas não param. E se pararem já sabem o que foi que aconteceu, né?! Portanto vamos fazer dos 80 litros mensais antes consumidos pelo doutor Júpiter por 200 shows em todo o Brasil, porque todos nós precisamos ter essa experiência que transcende a música pela música, a freqüência pela freqüência, a diversão pela diversão. Somos os seres que povoam esse planeta esquizofreak e o Júpiter Maçã a melhor trilha sonora.

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*Túlio Flávio é paraibano, músico, gosta de ouvir Zackarias Nepomuceno e A Mãe de Quem?. Mora no Rio de Janeiro.