por Mauro Castro*
Chego ao meu ponto de táxi antes de amanhecer. O lugar está vazio e o telefone está tocando. Corro para atender. Uma mulher com voz preocupada passa o endereço e pede que eu tenha pressa. Ela diz que está acudindo uma vizinha, precisa de um táxi para levá-la ao hospital.
Chegando ao endereço indicado, encontro a mulher no meio da rua, acenando aflita. Fecho o táxi e entro em um pequeno prédio. A mulher vai na frente, explicando que sua vizinha do primeiro andar está com dificuldades de respirar. Entramos pelo apartamento modesto. A vizinha leva-me até o quarto, onde uma senhora esta deitada. Ela está pálida, suando, o abdômen sobe e desce, parece não encontrar oxigênio. Está agonizando.
Percebo que não conseguirei tirá-la dali: a mulher não caminha, fala com dificuldade, é pesada. Ligo para o 192.
O socorro chega em poucos minutos. Ajudo os socorristas da SAMU a levar a mulher até a ambulância. Nós a carregamos suspensa em um lençol, como se fosse uma rede, pois a maca não coube no corredor. Antes de chegar ao veículo, a paciente para de respirar. Não se debate mais, seus olhos fecham, seu queixo cai. Percebemos o que aconteceu e apuramos o passo.
Com a paciente já dentro da ambulância, os esforçados (heroicos) paramédicos começam procedimentos de ressuscitação. Eu e a vizinha da mulher ficamos na calçada, atônitos, sem o que dizer. O dia está amanhecendo, o silêncio do bairro é interrompido pelos bipes dos aparelhos da UTI móvel. O veículo balança com a força da massagem cardíaca. Depois de alguns minutos, que parecem uma eternidade, a mulher volta a respirar.
Com a paciente estabilizada, a ambulância parte veloz, com suas luzes piscantes. Volto para meu táxi e parto também. Rodo devagar, tentando absorver tudo o que vi. A essa altura, o sol já brilha forte, aos poucos as ruas acordam e a rotina me abraça. Mas esse não será mais um dia qualquer: o dia em que socorri alguém que estava no limite da vida.
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* Mauro Castro é taxista em Porto Alegre e é conhecido na internet por seu blog Taxitramas, em que publica crônicas sobre o cotidiano do seu ofício. Entrevistamos ele por aqui há alguns anos.
Que da hora esse texto. Uma perspectiva singular.
Adriano.
tu é foda, mauro. cruzacorrecabeceiamarca e comemora com modéstia, à socrates na de 82.
Valeu, Pessoal, obrigado pela lembrança do Taxitramas.
Há braços!!
Muito bom ter texto seu por aqui.
bj