Coceirinha aqui

Por FErio*

Em dois tempos a mancha aumentou de tamanho. De pequenina gota penetrando em tecido morno, era agora espessa e empapada, gotejando pelo braço abaixo. O epicentro da coceira era uma pequena eczema avermelhada no comecinho do ombro. Passou a unha assim, como quem não quer nada. A coceira era boa, satisfazia-lhe o roçar na pele, a dorzinha. Essa era ainda melhor, pedia coçadas mais agressivas e concentradas. Um descamar leve,  riscos esbranquiçados  na área afetada, que se avermelhavam fazendo vergões ruborizados. A coceira, tem esse prazer proibido, crescente que leva a dar uma coçadinha extra, uma coçadinha pós coçadinha, e mais outra e outra. Rompe-se uma parte de pele e a gotinha de sangue surge brilhante. Ele se assusta, mas a coceira, que já se espalhou pelo braço é boa. Enquanto faz outras coisas, torna a dar algumas coçadinhas matreiras, descompromissadas, mas em lampejos de vontade a raspagem da epiderme torna-se mais e mais violenta, mais sangue brota, pedaços de carne se expõem. A dor pós coceira é absurda, traz junto com ela, o arrependimento de tentar ir cada vez mais longe. Ele se deita, fica com os olhos fechados, esperando parte da dor passar, já que elegeu novos pontos de coceira no outro braço e no peito. E no ombro. E na virilha. Nas coxas. A vontade ressurge num roçar de algo leve com a mão, numa cócega do cobertor às costas, e a coçada é cada vez mais brutal, quase animalesca, com urros e sons de raspar, e sangue brotando por todos os lados, delicioso, deliciosa sensação, tão ampla, e efêmera.
.
* Rodrigo se esconde em uma parede fantástica inexistente e se engana que é FErio. FErio convence Rodrigo que este, não é nenhum dos dois, mas que ambos são outras pessoas que ele desconhece mas que escrevem a respeito dessa terceira.

Um comentário em “Coceirinha aqui

Os comentários estão encerrados.