por Luciano Vitoriano*
Quando acordei, estávamos estacionando em uma espécie de galpão de jipeiros. Eu desembarquei, sonolento, e perguntei à guia o que estávamos fazendo ali. Eu estava totalmente perdido, pois não ouvi nada do que ela explicou. Ela respondeu que estávamos trocando de transporte, pois, para seguir nossa viagem para o lago do Choro, teríamos que pegar uma trilha pela mata. Demorou alguns segundos até cair minha ficha… “Lago do Choro?” – perguntei com um sorriso nervoso. “Sim, senhor”, ela respondeu. Eu disse que não era para lá que eu tinha comprado o passeio, que tinha comprado um passeio muito mais caro e que não me interessaria passar o dia andando de jipe. Ela me mostrou o comprovante e disse “senhor, aqui está seu comprovante, você comprou exatamente este passeio”. Eu fiquei revoltado. A recepcionista me cobrou o dobro do preço e me colocou em um passeio que eu não comprei! Na pressa com que saí, nem li o comprovante. Eu estava indignado! Virei as costas para a guia e disse: “vocês podem ir sem mim! Eu vou dar um jeito de voltar para o hotel! Vou matar aquela incompetente!”. Visivelmente constrangida, a guia tentou acalmar-me, sem sucesso. Eu a empurrei para o lado e saí andando. O pior é que aquele lugar ficava em uma parte isolada da cidade. Eu teria que andar um bocado até chegar ao centro, onde poderia conseguir um taxi.
A van da empresa de turismo foi embora e os passageiros saíram em seus jipes, felizes, para seus passeios. Eu fiquei ali, amoado, revoltado. Dei-me conta, então, que não sabia nem onde estava. Perguntei para um jipeiro “amigo, que cidade é essa?”, “Desespero, senhor”. Eu conhecia Desespero de ouvir falar: a cidade mais insuportável do mundo. Crimes, trânsito, um clima quente, abafado e úmido. Estava no pior lugar que poderia estar em um raio de 500 kilômetros. Contei a ele minha história e meu plano de caminhar até a cidade para procurar um táxi. Ele disse que não faria isso se fosse eu, pois, há muitos perigos naqueles caminhos até a cidade. Bandidos ficam à espreita, procurando por turistas desavisados como eu.
Eu disse “então, você está dizendo que eu vou ter que ficar aqui até a van voltar para pegar os outros passageiros?” e ele disse “não, senhor, porque isso não irá acontecer. A van, quando sai daqui, vai por um caminho de estrada para a cidade de Choro e é lá que ela vai pegar os passageiros, no final do dia”. “Então, o que eu faço?”, perguntei. “Bom, eu posso falar para meu chefe se ele não faz um preço melhor para o senhor e a gente aluga um jipe para levar o senhor de volta para Perda.”, respondeu o jipeiro. “Puxa, se você fizer isso, eu fico muito agradecido”, respondi, sentando em uma cadeira velha com vários rasgos em seu estofamento.
Não demorou muito até ele voltar acenando positivamente. Falou-me o preço – muito salgado, por sinal – mas eu tive que aceitar. Fomos até a sala da gerência para passar meu cartão. Deu errado a primeira vez. Ele passou novamente, digitei a senha e deu mais um erro. Eu já sabia, mas, fiquei ouvindo quando ele falou que, caso tentasse novamente e desse erro, poderia ter meu cartão bloqueado. Sugeriu, então, que utilizasse um pequeno caixa 24 horas que havia a cinco minutos dali, em um posto de gasolina. Garantiu que, por aqueles caminhos, eu poderia andar sossegado porque eram seguros.
Não tive opção, fui até o posto e acessei minha conta. Para minha surpresa, descobri que a máquina dos jipeiros não tinha nenhum problema e nem tampouco meu cartão. O problema era que, simplesmente, minha conta havia sido zerada… Provavelmente haviam clonado meu cartão. Fiquei desnorteado. Será que teria sido no hotel? Não, eles não se arriscariam a escândalos com fraudes deste tipo… Então, veio uma lembrança em minha mente: a máquina de cartão do taxista… Bem que eu senti que não era boa gente quando ele me disse que torcia para o Antítese… (continua).
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*Luciano Vitoriano é paulistano, fã de ficção científica e colecionador de profissões. Dorme pouco, sonha muito. Mora em São Paulo.