por Jamile Vasconcelos*
Todo mundo, pelo menos alguma vez na vida, já se viu obrigado a ir contra a própria vontade. Não tem como negar. Seja por desejo, necessidades trabalhistas ou determinações sociais, o fato é que vez ou outra temos que fazer alguma coisa que não estava nos planos. Ai, às vezes, por outro lado, queremos, precisamos, lutamos, desejamos e tentamos fazer de maneira diferente e não conseguimos. Como é isso?
As pessoas vivem três vidas diferentes. A que elas querem viver, a que elas mostram que vivem e a que os outros imaginam que ela vive. No meio disso tudo, tem mais um milhão de bombardeios, como as mudanças. Ninguém é uma única coisa eternamente. Leia-se uma única coisa, não como apenas uma única coisa. Primeiro que as pessoas realmente mudam. O tempo passa e a maneira de ver e entender o mundo muda, nos tornamos mais flexíveis e tolerantes e, sobretudo, passamos a perceber e aceitar as diferenças. Além dessas mudanças “normais”, tem também as mudanças “espontâneas”, conhecidas também como evolução pessoal. São acontecimentos, traumas, medos e incapacidades que foram gerados em algum momento da vida e parece que passaram, mas, na verdade nos atormentam a vida inteira até que seja superado. Eles determinam suas relações afetivas, sexuais, encontros amorosos, relações de amizade e familiares. Uma pendência lá no fundo do baú e adios! São faltas e excessos de si próprio, freios e aceleradas, que, no final das contas, acabam ocupando o mesmo lugar.
Tendo de mais ou de menos, o fato é que dá pra mudar. Dá pra chegar a um ponto de equilíbrio e encontrar a solução para aquele buraco no meio da existência. Teoricamente, é mais simples do que parece, na prática, mais difícil que se espera. O primeiro passo é justamente aceitar que ele existe. Aí, é ter paciência. O negócio demora muito pra ser resolvido e o percurso é todo seguido por um diabinho que fica o tempo inteiro catucando pra que a gente deixe de lado a árdua tarefa. É uma estrada longa, feia, fria, suja e dolorosa, cheia de tentações e guloseimas, potes de ouro e muito flam caramelado no acostamento. Um simples grão de açúcar e bye, já foi, nem Orfeus foi capaz de retomar o caminho. O prazer é grande demais para se dar conta da armadilha. Mas, se a paciência for grande e a coragem maior ainda, dá pra chegar lá, afinal de contas, somos apenas nós contra e a favor de nós mesmos. Testemunhas, juizes, réus e advogados. Esse tribunal é individual e exclusivo. Não entrar na estrada, é uma escolha, desistir no meio também, mas, se deliciar com a absolvição do veridito final é conquista.
Caos, por Jamile
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* Jamile Vasconcelos é baiana, produtora cultural, fotografa e rabisca nas horas vagas. Simpatiza com andróides.