Acredito que o gênero mais tradicional do quadrinho brasileiro é o humor. Os autores mais citados e referenciados das tirinhas (aqui falo do público adulto) quase sempre são os que fazem quadrinhos de humor. Acho que não preciso nem citar exemplos. Lembro que foi um pesquisador português de banda desenhada (que é como eles chamam os quadrinhos) que me chamou a atenção para isso, nunca tinha parado para pensar no assunto. E parece ser um gênero atribuído também a homens, pois mulheres “falam com a emoção”, certamente diria alguém.
Daí dou de cara com as tirinhas da Olga, a sexóloga, da paraibana Thaïs Gualberto. Pronto, se você achou que tudo isso que disse antes era verdade absoluta, aqui está o exemplo de que nada é realmente absoluto. Assim como nem tudo no quadrinho nacional gira em torno do humor, nem todo humor nos quadrinhos é feito por homens.
Mas vamos falar dessa menina Olga, que mal conheço e já curto pacas. Uma sexóloga “taradóloga”, que atende clientes com problemas e dúvidas sexuais, mas expõe sua própria vida sexual também, como uma espécie de modelo para a juventude. Parece didático demais falando assim, mas é puro escracho inteligente, com pitadas de feminismo.
Em tempos de bancada evangélica e o fim das campanhas de conscientização sobre os perigos do sexo sem preservativo, Olga bate insistentemente na tecla “use camisinha”. Numa tirinha (que já é a minha favorita ever), ela pede pro parceiro pegar a camisinha e ele pergunta “não confia em mim?”. Ela responde na lata “claro que não!”. É isso, minas, precisamos nos cuidar.

Outra tirinha ótima é a do cara que fala mal da mulher porque ela reclama que ele não lava a louça. “Isso é coisa de mulher”, ele diz. Adorei ouvir da Olga uma expressão que usava na adolescência para definir homens que tinham “medo” de lavar louça, eu os chamava de CP. Nossa sexóloga explica na sua resposta sobre ser coisa de mulher: “é? O pinto cai?”. (preciso explicar que CP é cai o pinto?)

Nossa querida taradóloga também fala sobre anticoncepcionais (e seus danos à saúde), calcinha que não combina com sutiã, sobre engordar, moda, padrões de beleza, aborto. São muitas cenas de conversas que lembram as que experimentamos todos os dias com amigas e amigos, muitas delas conversas bêbadas, e aqui são praticamente todas sobre sexo, claro.
Olga, a sexóloga taradóloga começou a ser publicada na internet em 2009, no blog Kisuki. Dá para ler muita coisa por lá, mas para quem gosta de um livrinho, essa edição está gracinha, num formato quadradinho, gostoso de manusear.

Thaïs, no posfácio do livro, fala sobre a trajetória da Olga, em que foram produzidas mais de cento e trinta tiras, e como escolheu as que estão no livro: “o fato é que eu, como quadrinista, me transformei junto com a Olga, a personagem. Então não foram selecionadas as tiras que considerei sem graça, nem aquelas cujo conteúdo passei a achar pernicioso e mesmo entre as que ficaram, muitas foram reformuladas”. Um gesto de análise da própria obra que achei muito interessante, o que também me chamou a atenção na leitura.
Então é isso, pessoas. Mulheres fazem quadrinhos. Além disso, mulheres fazem quadrinhos de humor. E é possível fazer humor sem bater nos mais fracos. Quer conferir, vai lá e dá uma lidinha no site, ou aproveita e compra e ajuda as minas a continuar a fazer quadrinhos.

Olga, a sexóloga
Thaïs Gualberto
140 páginas
Formato: 14,8 x 14,8 cm
http://kisuki.me/
O livro foi cortesia da autora
(texto originalmente publicado no MinasNerds)